a conversa 22 E onde entra a sua paixão pelas Belas Artes? Estive muito indecisa em ir para artes ou para ciências. Sempre gostei de muitas coisas diferentes. Ao longo da vida, a par do curso, frequentei vários ateliers, com alguns pintores conhecidos. Assim, tentei satisfazer as duas vertentes. Para mim era assustador trabalhar das nove às cinco, ou trabalhar numa consultora, num banco. Cheguei a ter um convite para trabalhar no BES, numa agência na minha rua. Seria o meu pior pesadelo. Quando recebi o convite, passei toda a minha vida futura em filme, na cabeça: “Vou ficar na rua onde sempre vivi. Fechada neste mundo”. Era tudo o que eu não queria. É notável que, na altura, tenha tido essa visão. Ter essa perceção do que não se quer. Ainda hoje não tenho problemas em abraçar desafios novos e estar aberta a outras experiências. Sei que não quero estagnar. Pelo contrário. Quer devorar o mundo de todas as formas que conseguir, sem se demitir de uma única possibilidade. O que busca quando mergulha de cabeça num novo desporto, por exemplo? Quando faz mais uma maratona? Às vezes pode parecer um bocadinho de arrogância, mas acho que é possível aprender tudo. O que me custa mais na relação com os outros é perceber que muitas pessoas não estão abertas a novas experiências. Custa-lhe perceber que elas não têm a sua perplexidade, a sua capacidade de espanto em relação ao mundo… Sim, penso sempre que, se existe um problema, temos de o solucionar. Não acho, à partida, que é impossível. Eu valorizo muito isso. Só que, depois eu arranjo uma solução para tirar aquele lacado da mesa que tenho lá em casa, arranjo um caminho, aprendo. Mas entretanto sinto que tenho de ficar especialista em tirar lacados da mesa, tenho de ler tudo sobre isso! Para mim era assustador trabalhar das nove às cinco. Cheguei a ter um convite para trabalhar na agência do BES da minha rua. Seria o pior pesadelo A pergunta é: como arranja tempo? Porque a sua lista de interesses vai da natação ao ioga, passando pela decoração e pintura de interiores, fazer velas e sabonetes, praticar triatlo, ser cronista do Expresso. Para não falar no trapézio aéreo! Como é que isso aconteceu? Eu sempre fiz desporto, desde criança. Sempre. É essencial. Quem faz desporto de competição desafia-se constantemente, tem muitos objetivos. Os desportos que fiz, muitos deles, são individuais. Vim da ginástica acrobática, fiz natação, depois comecei nas maratonas, triatlo, etc… Aos 16, 17 anos, comecei a correr muito, porque achava que tinha todo o espaço do mundo para explorar, busquei essa liberdade. Sempre tive muita resistência, sou baixinha, era muito magra. Quando fiz o doutoramento na Holanda e depois fui para os Estados Unidos, já corria em várias equipas, tive patrocínios de algumas marcas de desporto. Nos Estados Unidos, encontrei muita gente igual a mim, que fazia imenso desporto, com horários estranhos. Pensei: “I found my crowd”. Comecei a fazer longas distâncias, ultra maratonas, e claro que dei cabo destes tendões, que ligam a parte de cima do glúteo. Tive grandes lesões, várias intervenções cirúrgicas e sabia que tinha de parar de fazer competição. Estava muito frustrada. Ainda hoje é uma coisa que me custa aceitar. Foi aí que entrou o trapézio? Sim. Fui procurar algo completamente diferente, que pudesse aprender desde o início, que me desafiasse, em que não envolvesse tanto as pernas, porque eu tinha mesmo de descansar as pernas. Então, cruzei-me em Portugal com um centro de artes para acrobacias aéreas e quando regressei aos Estados Unidos pensei que tinha de arranjar um sítio para continuar com o trapézio. E descobri uma escola em Chicago, um estilo de trapézio voador, de circo, em que aprendemos a trabalhar com a gravidade. Foi ótimo! Aprendi algo totalmente novo. E isso é importantíssimo para mim. Tenho grupos de amigos completamente diferentes, com vidas quase antagónicas. Isso faz de si uma pessoa multicolor. Multidimensional. Sim. Ajuda-me a sair fora da caixa. Ter um olhar inaugural sobre as coisas? Na ANACOM,
“Julgo que a litigância (na ANACOM) já acalmou. Tem sido muito importante dialogar. Quando falamos de questões de segurança, estamos a falar da sustentabilidade do setor. Estamos todos unidos para criar um setor mais seguro” como é que essa criatividade poderá ser útil num setor que precisa tanto dela, numa fase de litigância absoluta entre os players e o regulador? Julgo que a litigância já acalmou. Tem sido muito importante dialogar. Quando falamos de questões de segurança, estamos a falar da sustentabilidade do setor. Estamos todos unidos para criar um setor mais seguro, mais resiliente. As questões da segurança proporcionam diálogo, porque é do interesse de todos, é uma preocupação comum. O regulador tem uma função e um objetivo diferente dos operadores. É natural. Mas, no meio deste desalinho, é possível encontrar um equilíbrio. Achar pontos de encontro. É isso que tem feito nestes primeiros meses? Sim. Reunir com os operadores, com os fornecedores e restantes stakeholders do setor, com organismos públicos, outros reguladores, associações de consumo. Na verdade, com toda a gente. E o que sentiu até agora? Recetividade? Sim, muita recetividade. Como havia muita tensão, muita falta de diálogo, também havia muita expectativa de tornar este diálogo eficaz. Tem defendido o conceito da eficiência dinâmica para o setor. Fale-nos deste conceito. É quando o bem-estar social é maximizado em situações de concorrência. E atinge o seu mínimo em monopólio. No setor das telecomunicações estamos num oligopólio. Não é como o setor das churrasqueiras de bairro, por exemplo, um setor verdadeiramente concorrencial: o produto é todo igual, muito homogéneo, com baixo investimento tecnológico. Nas telecomunicações estamos numa situação intermédia. Quando se aumenta o número de concorrentes, teoricamente aumenta-se o bem-estar. O problema é se, nesta passagem, se destrói a capacidade de investir. Temos que ter cuidado, sobretudo quando estamos em momentos de novas ondas tecnológicas. Devemos aumentar a concorrência, mas com cuidado, porque exige grandes investimentos. Tem de haver esse trade-off, tem de ser dinâmico. Sim, as mudanças tecnológicas são cada vez mais rápidas e exigem, por isso, cada vez mais capacidade de investimento. Julgo que devemos pensar num modelo económico de financiamento do setor. Porque o 5G pode ser realmen- 23
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