a conversa “Se olharmos para as Nações Unidas, a culpa não é do secretário geral. Na ONU olhamos para o Conselho de Segurança e aquilo é uma fotografia de 1946. Os cinco países que têm direito de veto são os cinco países que foram vencedores da Segunda Guerra Mundial”. (...) “Há um grande desajustamento das organizações internacionais às circunstâncias” 18
Quais são as suas expetativas em relação a este congresso, cujo tema de base é “Tech & Economics: the way forward”? Acho que o programa é bastante interessante, porque é de grande espetro, ou seja, é difícil alguém que tenha uma relação presente ou futura com o digital não se interessar por partes significativas do seu conteúdo. A APDC tem a enorme qualidade de ser uma plataforma onde há interesses divergentes, mas valores convergentes. Isso permite uma abordagem de temas mais profunda. Acresce que este congresso realiza-se num momento particularmente interessante, em que temos novos órgãos de soberania eleitos, estamos a sair de uma pandemia e, obviamente, a viver uma circunstância geopolítica na Europa que tem consequências geoeconómicas e uma face digital. Essa é mais uma prova da relevância do digital… Sempre houve, em todas as guerras, batalhas operacionais e batalhas de comunicação, que eram ao mesmo tempo batalhas de mobilização. Desta vez, essa batalha tem um território quase planetário que é oferecido pelas plataformas digitais e nessa frente – não deixa de ser uma ironia do destino – a Rússia, que infelizmente, a meu ver, se tinha especializado de forma demasiado agressiva em cibercrime muito orientado, neste momento está a perder a batalha em termos digitais de uma forma avassaladora. Provavelmente foi uma das condicionantes em que não pensou. De facto, foi surpreendente que a Rússia se tenha desorganizado tão facilmente nesta frente de batalha. Encontra alguma explicação para isso? Os regimes autocomplacentes são surpreendidos por aquilo que não conseguem medir. É certo, não há nenhuma dúvida sobre isto nas comunidades digitais, e nas comunidades ciber em particular, que a Rússia – não digo os órgãos do poder central, mas órgãos muito próximos das forças armadas – se especializou em ataques ciber muito organizados e agressivos. Mas nesta circunstância eles cometeram vários erros de planeamento, como já todos percebemos. O que não significa que não venham a atingir os seus objetivos ou parte deles, com um grau de destruição enorme. Só que, entretanto, o mundo das plataformas da Rússia mudou completamente, por decisão das próprias plataformas. Não é que estejam debaixo de sanções, mas o facto é que a Rússia sofreu a deserção de plataformas que são globais e que tinham algum significado na Rússia. E depois disso, o próprio governo não demorou muito tempo a pisar a linha da censura sistemática, que é uma coisa que caracteriza as guerras. Mas voltando ao congresso: o facto de acontecer na saída da pandemia, num ano em que em qualquer caso – com melhor ou pior resultado, dependendo da continuação da guerra – é um ano positivo e não negativo, no sentido em que vamos ter crescimento… Está seguro disso? É muito difícil fazer previsões neste momento, mas eu faço o seguinte exercício: se 2019 foi o último ano em que vivemos sem pandemia e sem guerra, pergunto- -me quanto tempo é que cada país demora a recuperar o que tinha em 2019. A partir daí é sempre a ganhar – a crescer. De acordo com as previsões do FMI, estamos mesmo na linha da frente – somando o ano passado com este – para conseguir ter já recuperação em 2022, mas acho que outros países europeus podem vir a recuperar apenas em 2023. No fundo, o que é mais útil nestes tempos é saber navegar na incerteza e descobrir, nesse contexto, os pontos mais seguros. E, para a nossa recuperação económica, o setor digital é absolutamente determinante. Digital e globalização são indissociáveis. Depois desta guerra, a globalização continuará a ser como antes? Na semana passada, a Organização Mundial do Comércio – que em Portugal não é demasiado notada, nem falada, mas que é bastante importante para o funcionamento das economias – fez um alerta sobre o que é o risco de as economias voltarem a funcionar por blocos políticos. Temos todos a sensação de que estamos a voltar a um ambiente de guerra fria, mas isso depois tem consequências económicas. Se não conseguimos comprar nem vender, empobrecemos. Há uma coisa básica que as pessoas têm de perceber: a ideia de que fechar os países contribui para a sua prosperidade não é verdadeira. Em geral, precisamos de comércio aberto. Mas será impossível manter tudo a funcionar como antes… Há dois fenómenos que, se não forem conjunturais, podem causar uma disrupção. Primeiro: esta tendência para tentar alinhar o mundo em blocos políticos, em que a geopolítica toma outra vez conta da geoeconomia (note-se que vivemos as décadas mais prósperas quando, em certo sentido, a geoeconomia prevaleceu, ou foi tão importante como a geopolítica). Segundo: fi- 19
ultimas ESCOLHER O PORTÁTIL PARA O
Loading...
Loading...
Loading...